Ao STF, ex-comandante da Aeronáutica confirma que Bolsonaro participou de plano golpista e que Freire Gomes ameaçou prender o ex-presidente
22/05/2025
(Foto: Reprodução) Afirmação de Carlos de Almeida Baptista Júnior desmentiu o ex-comandante do Exército que, também em depoimento ao STF, negou que tivesse ameaçado prender Bolsonaro se ele levasse adiante o plano golpista. Ex-comandante da Aeronáutica confirma ao STF reunião golpista com Jair Bolsonaro
O ex-comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, prestou depoimento nesta quarta-feira (21) à Primeira Turma do STF. Ele confirmou que Jair Bolsonaro participou de um plano para permanecer no poder e que o então comandante do Exército ameaçou prender Bolsonaro se prosseguisse na tentativa de golpe.
O depoimento não pôde ser gravado por ordem do Supremo, mas jornalistas puderam acompanhar e anotar tudo. Durante uma hora e 20 minutos, o ex-comandante da Aeronáutica tenente-brigadeiro Baptista Júnior confirmou o que já havia dito à Polícia Federal em fevereiro de 2024: que o ex-presidente Jair Bolsonaro foi informado, em mais de uma oportunidade que o Ministério da Defesa não identificou falhas no sistema eletrônico de votação; e que Bolsonaro pressionou para que fosse adiada a divulgação do relatório que continha essa informação. Em diversas ocasiões, Bolsonaro fez ataques às urnas sem apresentar provas.
O brigadeiro Baptista Júnior afirmou ainda ter participado de reuniões para tratar da adoção de uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem) ou de estado de sítio e de defesa. O brigadeiro revelou que, em uma dessas reuniões, no dia 11 de dezembro de 2022, percebeu que o tema avançava para uma possível ruptura institucional:
“Eu comecei, pessoalmente, a entender que aquela Garantia da Lei e da Ordem que nós estávamos acordando não era o que eu estava acostumado a ver as Forças Armadas cumprirem desde 92. E nós começamos a ficar desconfortáveis, pelo menos eu, ministro Paulo Sérgio e o general Freire Gomes”.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, perguntou se Baptista Júnior confirmava o que havia dito à Polícia Federal sobre o alerta de prisão feito pelo então comandante do Exército, general Freire Gomes, caso Bolsonaro desse curso a uma ruptura institucional:
“Confirmo sim, senhor. Eu acompanhei anteontem a sessão, estava chegando de viagem. General Freire Gomes é uma pessoa polida, educada, logicamente ele não falou essa frase com agressividade com o Presidente da República. Ele não faria isso, mas isso ele falou, com muita tranquilidade, com muita calma, mas colocou exatamente isso: ‘Se o senhor tiver que fazer isso, eu vou ter que acabar lhe prendendo’”.
Essa afirmação desmentiu o ex-comandante do Exército que, na última segunda-feira (19), também em depoimento ao STF, negou que tivesse ameaçado prender Bolsonaro se ele levasse adiante o plano golpista.
Ainda em resposta a Paulo Gonet, Baptista Júnior disse que os militares trabalhavam com a possibilidade da adoção de uma GLO apenas em caso de “convulsão social” no Brasil, e que falou com o presidente Bolsonaro:
“Aconteça o que acontecer, no dia 1º de janeiro, o senhor não será presidente. Ou seja, a GLO que nós estávamos falando era para o caso de um evento, de um problema em alguma cidade, algum estado, alguma convulsão social”.
Ao STF, ex-comandante da Aeronáutica confirma que Bolsonaro participou de plano golpista e que Freire Gomes ameaçou prender o ex-presidente
Jornal Nacional/ Reprodução
Ao ser questionado sobre a intenção de prender autoridades, o brigadeiro confirmou que, em uma das reuniões com Bolsonaro e o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, essa sugestão foi feita:
“Foi sim, senhor. Do ministro Alexandre de Moraes”.
Segundo o brigadeiro, um dos presentes na reunião levantou a hipótese de que os outros ministros do Supremo poderiam libertar Moraes com um habeas corpus. Essa pessoa não foi identificada:
“Nós prendemos o presidente Alexandre de Moraes, que é o presidente do TSE? Vai. Amanhã o STF vai dar habeas corpus para soltar ele, e aí nós vamos fazer o quê? Prender os outros onze? Mas esse era um brainstorm buscando uma solução que já estava no campo do desconforto. Pelo menos para mim estava”.
Baptista Júnior confirmou que, em uma das reuniões em que Bolsonaro estava presente, o então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, se dispôs a apoiar o plano golpista:
“Dessas reuniões, eu tenho uma visão muito passiva do almirante. Eu lembro que o ministro Paulo Sérgio, Freire Gomes e eu conversávamos mais, debatíamos muito, tentávamos demover a mais o presidente. Em uma dessas, chegou um ponto em que ele falou que as tropas da Marinha estariam à disposição do presidente”.
O ex-comandante da Aeronáutica também confirmou a existência da chamada “minuta do golpe”. Disse que o documento foi apresentado a ele, a Freire Gomes e ao então comandante da Marinha, Almir Garnier, no dia 14 de dezembro de 2022, pelo então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira:
“O estado de sítio era uma coisa que eu não imaginava que fosse aparecer essa expressão. Ele falou assim: ‘Eu trouxe aqui um documento, que é para vocês analisarem’. Logicamente, com base em tudo o que estava acontecendo, eu perguntei para ele: ‘Esse documento prevê a não assunção no dia 1º de janeiro do presidente eleito?’. Ele falou sim. Daí, eu falei: ‘Não admito sequer receber este documento, não ficarei aqui’. Levantei, saí da sala e fui embora”.
Paulo Gonet perguntou:
“Depois que o senhor se opôs à minuta de forma tão enfática, o senhor sofreu alguma espécie de ataque ou pressão presencialmente ou virtualmente?”.
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Baptista Júnior respondeu:
“Muitas. Não só minha pessoa, mas a minha família, o que foi muito difícil, viu?”.
Gonet quis saber se ele identificaria a fonte desses ataques. E o brigadeiro disse:
“Infelizmente também, sim, senhor. General Braga Netto”.
O ex-comandante da Aeronáutica disse ainda que encontrou o ex-ministro do GSI, Augusto Heleno, na formatura do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, no dia 16 de dezembro de 2022. Heleno pediu carona para voltar a Brasília em um avião da FAB porque foi chamado para uma reunião de emergência com Bolsonaro no dia seguinte. Na conversa, Baptista Júnior disse a Heleno:
“Eu e a Força Aérea, por unanimidade do Alto Comando da Aeronáutica, não vamos apoiar qualquer ruptura nesse país. Se alguém for bancar isso, saiba quais são as consequências. Logicamente, eu entendi que o ministro Heleno não estava sendo chamado para uma coisa trivial e quis deixar claro a posição novamente da Força Aérea, porque não tinha deixado para ele ainda”.
O brigadeiro Baptista Júnior foi a última testemunha indicada pela acusação para o chamado “núcleo crucial” da trama golpista, de que faz parte o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Nesta quinta-feira (22), começam as audiências de testemunhas escolhidas pelos advogados de defesa. Serão ouvidos nomes apresentados pelo tenente-coronel Mauro Cid, que fez delação premiada.
A defesa de Almir Garnier afirmou que Baptista Júnior tem “memória seletiva”; que, em relação às reuniões com outros comandantes e com o Presidente da República, Baptista Júnior aponta detalhes que se confrontam com o que foi apurado; e que, quando se trata de reuniões, inclusive na casa do próprio Baptista Júnior, ele se lembra com exatidão da data, mas diz ter se esquecido do que foi abordado.
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